Leges Barbarorum

Tema:  A teoria das fontes do direito com a pluralidade medieval de ordens políticas e jurídicas.

Leges Barbarorum

O período medieval teve como principais características as relações sociais. A vassalagem e a suserania “definem” a visão da maioria sobre esse. Porém esse período não se apresenta de forma tão simples e estratificado. Questões políticas e jurídicas possuem um passado histórico em comum. Mesmo com a decadência do Império Romano Ocidental algumas heranças foram mantidas e utilizadas do período subseqüente. O colonato e o comitatus, de germanos e romanos, definiram todo o sistema político, social, cultural e econômico medieval. Devido à alta descentralização política presente a situação jurídica fluía constantemente, pois cada ducato, principado ou organização possuía sua forma de construir e aplicar seus costumes e leis. Essa situação acabava que separava cada território e tornava-os independentes dos demais. Afinal, se cada um possuía suas próprias formas de resolver situações uma possível unidade tornava-se improvável. O crescimento e desejo de uma classe/grupo de unificar diversos territórios, com fins econômicos, utilizou de diversos artifícios para a justificação de suas imposições. Nascendo assim a idealização de uma sociedade composta por homens “livres” que não responderiam mais ao seu suserano e sim ao Estado que acabava de ser criado.

Deve-se primeiramente situar-se no período histórico da Idade Média, principalmente no seu auge, pois somente assim é possível compreender como que a “Idade das Trevas”, concepção inteiramente Modernista, conseguiu manter-se durante aproximadamente 1000 anos.  Durante esse período no Ocidente não existia mais uma visão/concepção de uma cidade grande – como Roma em seu auge – e por diversos exemplos históricos sabe-se que cidades exerciam grande influência sobre as demais. Cidades assim eram um exemplo de unificação e estabilidade, exemplos para Maquiavel de um Estado/Governo potência.[1] Essa ausência de visão deve-se a grande distância presente entre os feudos existentes que possuíam uma  produção totalmente destinada ao interno. Tornando assim a necessidade de comércio  pouco necessária. A ausência de força política e econômica do Rei complicava qualquer possível sonho de unificação tão almejada por uma classe que inicialmente era pouco organizada e poderosa, porém com o tempo tornou-se a principal força motriz de uma grande  transformação. A presença maciça da religião também atuou como um fator estabilizante já que com uma ausência de poder maior este assumiu o lugar. Certamente a Igreja que era mais universal, no Ocidente, tinha a possibilidade de impor alguns dogmas que assumiam caráter de leis e que com sua prevalência atuaram como costumes.

“[…] Deus tinha distribuído tarefas especificas a cada homem; uns deviam orar pela salvação de todos, outros deviam lutar para proteger o povo; cabia aos membros do terceiro estado, de longe o mais numeroso, alimentar, com seu trabalho, os homens de religião e da guerra.[…]”[2]

A decadência desse período começou com a junção de diversos fatores, alguns independentes e outros nem tanto, que acarretaram na transformação da Idade. A crise do século XIV, o grande crescimento populacional, a escassez de terras para a produção, a presença da Fome e da Peste Negra foram o propulsores para o fim.  A crescente e organizada classe, a burguesia, auxiliava de diversas formas para que esse sistema obtivesse um fim. A criação e divulgação de idéias que combatiam o antigo sistema começaram a ser disseminadas e o Rei – um símbolo de centralização – começou a ver seus recursos e suas chances crescerem. O Renascimento foi o movimento que simboliza essa mudança, a Reforma Protestante também obteve sucesso e aceitação devido seu caráter compatível com as necessidades comerciais da época. O plano em sua essência seria: Unificar diversos grupos e sociedades, na medida do possível e que possuíam características em comum, criar um Estado, acabar progressivamente com a pluralidade que dificultava a adesão e união, e a criação de leis que serviriam como um espelho da unidade. A diversidade de costumes era um exemplo das diversas unidades espalhadas pelo continente. A transformação e a adequação dos costumes as novas intenções seria um trabalho que levaria certo tempo, porém que em longo prazo causaria a ordem e o controle. Afinal a aceitação das leis colocaria todos os residentes de um Estado em igual, algo imaginável no periodo anterior.

A partir dessa ideia de igualdade surgiu a necessidade de firmar bases para o melhor funcionamento do Estado e da sociedade. Os contratos sociais foram fatores indispensáveis para esse novo modelo político. Esses foram objeto de estudo de vários sociólogos como Hobbes e Locke que nesse contexto serão os mais relevantes.  Para explicar a construção da sociedade Hobbes  desenvolveu três leis fundamentais da natureza humana. A primeira delas é a de que todos os homens deve buscar e lutar pela paz, a segunda é de que todos os indivíduos devem se autopreservar,  para realização dessas é preciso que haja regras, que se dão por meio da terceira lei em que os homens devem cumprir seus contratos. Para Hobbes o Estado possui poder absoluto e tem o dever de garantir a segurança da sociedade, essa por outro lado deve seguir suas leis.

“A única forma de estabelecer um poder comum, capaz de defende-los da invasão pelos estrangeiros e das injurias que podem fazer uns aos outros, é confiar todo o seu poder e sua força a uma pessoa, ou a uma assembléia, que reduza suas vontades, expressas numa pluralidade de vozes, a uma só vontade.”[3]

Locke por sua vez acreditava que o individuo no estado de natureza sofre carências de leis que garantem sua segurança  para suprir essa necessidade se submete ao contrato social. De acordo com ele para que se estabeleça o Governo deve haver o consentimento da sociedade.  A partir desses contratos foi possível a consolidação do Estado.

O direito a igualdade foi um dos principais argumentos utilizados no discurso de criação do Governo, e para que isso fosse cumprido foram criadas as leis universais. Essas teriam a função de organizar a sociedade e garantir os direitos de seus civis. Os costumes e tradições, assim como as diversas religiões presente na sociedade criavam uma série de discussões  em relação ao que é certo e errado, a partir dessas surgiu a ideia do direito a liberdade, em que para o Estado o individuo é livre para fazer suas escolhas. Para que o Governo pudesse funcionar de forma a preservar as suas obrigações para com a sociedade foi adotado o Direito, esse por sua vez faz com que a interação entre Estado e sociedade aconteça de forma  justa, por fim concluimos que o Direito é um meio de garantir que ambos cumpram seus deveres contratuais.

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[1] Miguel, Luis Felipe. “Maquiavel e o desafio da política”. O Nascimento da Política Moderna: Maquiavel, Utopia, Reforma. Brasília: Editora UnB, 2007, PP. 13,14,15

[2] DUBY, Georges. As três ordens ou o imaginário do feudalismo. Lisboa: Estampa,1982.

[3] L.J Macfarlane, Teoria da Política Moderna, Pensamento Político, Capitulo I, O individuo e a sociedade. P.23

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